Eu cada vez tenho mais a certeza que vivo num país absolutamente terceiro-mundista, a nível cultural, social e de mentalidades.
Depois de duas semanas com grandes parangonas acerca da demolição das duas torres da Torralta, em Tróia, chegou finalmente o grande dia. A TVI, sempre na linha da frente no que toca à exploração mediática de tudo e mais alguma coisa - desde a gravidez da menina de 14 anos que o namorado abandonou, passando pela transmissão exclusiva do casamento da senhora Maria e do senhor José, com 92 anos cada um e que vivem no lar de não sei onde, até aos famosos directos quando começa a cair uma gota de água dentro de casa de uns idosos de 80 anos que vivem numa aldeia com 5 pessoas -, aproveitou, imediatamente, para fazer mais um directo (pergunto-me qual será o orçamento para a gasolina das carrinhas dos directos; deve ser bem elevado, presumo.)
Às 16h00 liguei a televisão a fim de observar o espectáculo. Música de fundo que a mim me fez um filme épico, género "Gladiator". De repente, ouço uma voz: "25 seconds".
"Ai, carago! Queres ver que a NASA vai lançar um vaivém, daqui de Portugal?"
- Wrong guess. Logo a seguir vem a voz off, em português.
10, 9, 8, 7...
O povo em delírio absoluto!
"O ano novo chegou mais cedo..."
...6, 5, 4, 3, 2, 1...
BRUMMM!!
E uma estrondosa ovação!!
O "demolidor Sócrates", como dizia hoje o Jornal de Notícias, tinha acabado de accionador o detonador. Ah, homem!
E o povo, de binóculos cravados na ocular (distribuídos pela SONAE, é preciso salientar), ali, de plantão, dispostos a apanhar com o pó na tromba, só para poderem ver o espectáculo do século.
Logo de seguida, a TVI repetiu 20 vezes a cena... Até à exaustão, diga-se.
É triste. Dedicaram horas a falar da porcaria da demolição, durante esta semana. Hoje, à hora do almoço, foram dedicados 5 minutos, se tanto, à divulgação de uma descoberta, nos EUA, que pode revolucionar o tratamento dos milhões de diabéticos por todo o mundo. Inalação de insulina, em vez de administração por injecção.
E viva a TVI, que contribui tanto para a nossa formação como cidadãos informados.
E, já agora, preparem-se, porque vem aí a "1.ª Companhia". Pelo que percebi, a tropa dos famosos. Parece que já estou a ver o José Castelo Branco, enquanto passa por baixo daquelas redes de arame farpado, a rastejar:
- Ai, senhor capitão, querido! Não se importa que me levante só um bocadinho para desentalar o fio dental do rabiosque?